quinta-feira, 12 de maio de 2016

A Acesso e sua contribuição para a construção de um direito insurgente

Essa semana, a coluna AJP na Universidade aproxima-se do fim de sua compilação dos textos produzidos para a disciplina tópica Assessoria Jurídica Popular, do primeiro semestre de 2014, da UFPR. O texto a seguir, de Heloyze Nathalie de Almeida, graduada em direito UFPR, aborda uma rica experiência de AJP (a da Acesso) e, dela, colhe reflexões sobre a prática de Assessoria em geral.

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A Acesso e sua contribuição para a construção de um direito insurgente

Heloyze Nathalie de Almeida

O Direito Insurgente se caracteriza pelo desenvolvimento da prática jurídica voltada à proteção dos menos favorecidos em face de um Estado distribuidor de desigualdades. Sempre munido de seu instrumento mais poderoso: o Direito.
Para que se possa compreender a real importância dos advogados populares construtores do Direito Insurgente é necessário ter em conta que a maioria da população é impedida de exercer minimamente a sua cidadania, sendo-lhe vedado ou obstaculizado o acesso à justiça. Outrossim, quando há alguma forma de prestação jurisdicional, esta sempre é cercada do caráter classista antipopular e pouco efetivo.
É nesse sentido que normas paralelas ao direito estatal são imprescindíveis, posto que através delas os oprimidos podem transformar a realidade de dominação e opressão existente no sistema capitalista. Entretanto, é preciso ponderar que sem o uso alternativo do direito imposto pelas classes dominantes, pouco é possível fazer, já que, infelizmente, ele ainda se faz presente em nossa sociedade.
Dessa forma, a atuação dos grupos formados por advogados populares, como a Acesso, se faz necessária, no sentido de que é por meio de sua militância que os injustiçados conseguem ver satisfeitos seus direitos.
A Assessoria Jurídica Popular é proposta com base em referenciais envolvendo a ética e a justiça, onde os menos favorecidos são o foco principal. De acordo com Alfonsin, (advogado que milita durante muito tempo pelas causas populares) a principal ideia da advocacia popular é unir concepções de um outro direito (seja o direito dos pobres, seja o direito insurgente) com uma concepção instrumental do direito (uso do processo judicial), que significa a união da assessoria jurídica com a prática insurgente.
A Acesso parte de uma concepção dogmática crítica do direito, onde a defesa processual dos movimentos populares é defendida fielmente. Contudo, sua atuação não se limita a esse tipo de defesa, tendo como formas de militância a orientação jurídica, a produção de teoria do direito e a tradução dessa teoria ao povo. É no trabalho de produção teórica que se percebe um diálogo aberto com o pluralismo jurídico e o direito alternativo.
A Assessoria Jurídica Popular pressupõe a mudança do lugar social do assessor jurídico que presta os seus serviços de maneira eficaz, além da mudança de pensamento quanto à interpretação do conteúdo jurídico-instrumental que cerca suas atividades. Segundo Alfonsin, a tarefa do assessor jurídico popular é a demonstração de que a pobreza já constitui, por si só, violação de direitos humanos fundamentais.
Além disso, a formação teórica de seus assistidos, que consiste na desmistificação dos mecanismos econômico-político-jurídicos, se revela um instrumento importante do trabalho desenvolvido pelos assessores jurídicos populares.
Ainda, o trabalho popular divide-se em três frentes, qual seja a comunitária, a política e a jurídica. Para ele, a mais importante é a comunitária, sendo a menos importante a jurídica. Isso demonstra que a verdadeira essência da assessoria jurídica popular não é a mera prestação de serviços jurídicos, mas sim a conscientização comunitária de que o povo pode se organizar e se posicionar frente à política para, através dos conhecimentos construídos em conjunto com os assessores, reivindicar os direitos que lhe são obstaculizados sistematicamente.
Todos os pontos desenvolvidos pelos advogados populares, que foram abordados nesse trabalho, traduzem o esforço de algumas pessoas comprometidas com a efetivação da justiça em transformar a realidade vivida pela maioria da população, seja por meio da utilização alternativa do direito estatal ou da formação teórica fundada no direito insurgente.
Referências:
PRESSBURGER, Miguel. “Direito insurgente: o direito dos oprimidos”. Em: RECH, Daniel; PRESSBURGER, Miguel; ROCHA, Osvaldo Alencar; TORRE RANGEL, Jesús Antonio de la. Direito insurgente: o direito dos oprimidos. Rio de Janeiro: AJUP/Fase, out.1990, p.06/12.

RIBAS, Luiz Otávio. Direito insurgente e pluralismo jurídico: assessoria jurídica de movimentos populares em Porto Alegre e no Rio de Janeiro (1960-2000). Florianópolis: Curso de Pós-Graduação (Mestrado) em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina, 2009, p. 57-72. 

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