quinta-feira, 4 de junho de 2015

O movimento geraizeiro e o direito

A coluna AJP na Universidade de hoje traz uma reflexão sobre a relação entre direito e movimentos sociais, mais especificamente entre uma visão alternativa de direito e o movimento geraizeiro, dentro do contexto dos povos e comunidades tradicionais brasileiros, tão ricos e diversos quanto pobre e formal é o fenômeno jurídico. O texto do mineiro Jonielson Ribeiro de Souza foi produzido originalmente para a disciplina de “Teorias Críticas do Direito e Assessoria Jurídica Popular”, da Especialização em Direitos Sociais do Campo da UFG, na Cidade de Goiás, ministrada por Ricardo Prestes Pazello.

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O movimento geraizeiro: busca por alternatividade no Direito ou por um Direito Alternativo?

Jonielson Ribeiro de Souza
Militante do movimento geraizeiro em Minas Gerais, estudante da Turma de Especialização em Direitos Sociais do Campo - Residência Agrária (UFG)

Segundo Roberto Lyra Filho, um crítico jurídico brasileiro, o Direito não deve se confundir com a lei, pois ele não é algo fixo, uma resposta pronta e acabada, mas um “vir a ser”. Este é um aspecto importantíssimo para entender a luta de diversos povos tradicionais brasileiros pela reapropriação de seus territórios, outrora os mesmos expropriados durante a colonização e ainda hoje. Através das leis hoje existentes, há um frágil respaldo no que tange à garantia também de sua sobrevivência étnica e física, levando vários desses povos a uma luta por alternativas jurídicas para suprir tal lacuna. Dentre estes povos cita-se os geraizeiros.

A Constituição Federal de 1988 avançou em vários aspectos no que tange à garantia dos direitos dos povos tradicionais, inclusive no que se refere à reapropriação de territórios tradicionalmente ocupados pelos mesmos. Porém, de forma específica e direta, cita apenas os povos quilombolas e indígenas, deixando em aberto a referência legal às outras populações tradicionais. A via do Movimento Geraizeiro – uma união de diversas comunidades geraizeiras da microrregião do Alto Rio Pardo (Norte de Minas Gerais) na luta pelo reconhecimento de seus territórios – tem sido a busca por um respaldo jurídico na garantia de proteção oferecida pela Constituição, mas também a de propor a criação de leis ou institutos que o façam a partir de sua particularidade como população tradicional específica.

Assim, percebe-se duas vertentes nesse movimento. Por um lado, há uso alternativo do Direito, entendendo tal expressão no sentido de que há o respeito às decisões já dadas, buscando, no caso, a efetivação das normas legais existentes. Mas também há o desenvolvimento de um Direito Alternativo. Este é de sentido mais amplo que o anterior, visto que se propõe a preencher lacunas do Direito posto, atender especificidades que o já existente não alcança, ou seja, criação de novos direitos. Esta inovação proposta pelo movimento geraizeiro, certamente necessária e presente em outras populações tradicionais, traz à tona a incompletude do Direito existente, e reafirma o entendimento de Lyra Filho, para o qual o meio jurídico só é compreensível num contexto de luta, denominado por ele de “dialética social do direito”.

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