quinta-feira, 26 de março de 2015

Direito dentro e contra a ordem, na teoria e na prática

Na coluna AJP na Universidade de hoje, publicamos o texto de Ednaldo Dias Assunção, a respeito do direito que se gesta dentro e fora da ordem, para dar conta da organização de movimentos populares, como os que lutam pela terra. O tema é sugestivo, em especial considerando a conjuntura em que vivemos, na qual se percebe um recrudescimento do respeito pela diversidade e uma rejeição de setores sociais, antes tolerantes, com relação à luta da classe trabalhadora. O texto foi produzido para a disciplina de “Teorias Críticas do Direito e Assessoria Jurídica Popular”, da Especialização em Direitos Sociais do Campo da UFG, na Cidade de Goiás.

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As teorias críticas do Direito e a luta pela terra no Brasil

Ednaldo Dias Assunção
Advogado popular no Distrito Federal
estudante da Turma de Especialização em Direitos Sociais do Campo - Residência Agrária (UFG)

No decorrer da História do Brasil sempre aconteceram movimentos que tinham como escopo a luta pela conquista da terra. Desde o período da escravidão, passando pelas lutas messiânicas, até chegar no período que deu origem aos movimentos de luta pela terra que subsistem até hoje.

Em todos estes momentos históricos podemos perceber um traço em comum que é a tentativa de romper com a ordem econômica e social vigente. Para tanto era necessário enfrentar também a ordem jurídica, que sempre garantiu a supremacia da elite detentora dos meios de produção sobre os desprovidos destes, afinal de contas o Direito foi também (e sobretudo), ao longo da História, um instrumento de opressão. De outra banda, ele sempre foi um instrumento de resistência, na medida em que ao se insurgirem contra a estrutura fundiária, conscientes ou não, muitos estavam enfrentando a ordem jurídica que sustentava os sistemas econômico e social.

Inconscientemente, a luta travada por estes agrupamentos e organizações estava propondo um novo entendimento acerca do que seria o “Direito”. Um “Direito” diferente daquele que estava positivado nos textos jurídicos, um Direito paralelo.

Na medida em que os agrupamento se organizavam, se fazia necessário a criação de normas internas, haja vista que todo agrupamento humano, para que tenha um mínimo de organização, precisa de normas que regulamentem as práticas cotidianas, de forma que possam administrar os conflitos internos. Assim, poderíamos dizer que nascia dentro das organizações de luta pela terra um outro direito, distinto daquele oficial, positivado pelo Estado, ainda que assimetricamente diferenciado deste, mas ainda assim, Direito. Porque sendo o Direito uma das formas de organização política, o direito que regulamenta uma organização social, que de alguma forma pretende alterar as bases políticas, sociais e econômicas de um determinado território, terá, necessariamente, um cunho político.

Sendo assim, o Direito produzido no interior de um movimento social, assim como em outras comunidades, é um Direito legítimo, não menos importante do que aquele produzido pelo Estado. Porque este regula as relações no âmbito nacional e aquele, as relações cotidianas internas de comunidades. Um não menos importante que o outro, mesmo que assimetricamente desiguais.

A partir das assertivas supra, podemos chegar à conclusão de que o que caracteriza o Direito não é a unicidade da norma, que regule todas as práticas existentes dentro de um mesmo Estado, mas uma variedade de práticas jurídicas coexistentes em um mesmo espaço social e político, que dêem conta de administrar os conflitos de interesses, ali criados.

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