quinta-feira, 14 de julho de 2011

Texto sobre Sánchez Vázquez no Brasil de Fato

Com felicidade, disparo a informação de que o jornal Brasil de Fato acolheu minha pequena pensata em homenagem a Adolfo Sánchez Vázquez, falecido na última sexta-feira, 08 de julho de 2011. O texto também foi incluído na página do Instituto Humanitas Unisinos - IHU. Seguem os elos:

 
 
 
Para finalizar, um texto de Atílio Borón, também relembrando Sánchez Vázquez: "Adolfo Sánchez Vázquez, in memorian".


(artigo de Atilio Boron publicado no jornal Página/12, 13-07-2011. Tradução do Cepat)

“Ser marxista hoje significa não apenas colocar em jogo a inteligência para fundamentar a necessidade e a possibilidade dessa alternativa (ao capitalismo), mas também tensionar a vontade para responder ao imperativo político-moral de contribuir para realizá-la”. (“Por que ser marxista hoje”. Discurso pronunciado por Adolfo Sánchez Vázquez ao receber o Doutorado Honoris Causa da Universidade de Havana)

Uma triste notícia: no dia 8 de julho, morria aos 95 anos de idade Adolfo Sánchez Vázquez, que, sem exageros, poderia ser caracterizado como um dos maiores filósofos marxistas da segunda metade do século XX e cuja influência se deixa sentir até hoje. Faleceu no México, país que o acolheu com sua proverbial hospitalidade no final da Guerra Civil Espanhola, em 1939.

Por muitas razões, o desaparecimento físico de Adolfo me tocou no mais profundo da alma. Foi ele quem me convidou a entrar profundamente no campo da filosofia política, instando-me a completar minhas análises sociopolíticas e econômicas do capitalismo com um olhar mais filosófico, que me abrisse as portas para uma reflexão mais integral, totalizadora e dialética das sociedades contemporâneas. Isso ocorreu no México, em 1976, quando a Flacso – naquela época ainda um foco de pensamento crítico – o convidou para dar um curso de Filosofia Política no Mestrado de Ciência Política. Ao aceitar, me solicitou que fosse seu assistente de cátedra e a partir desse momento sua obra e sua pessoa se converteram em uma fonte constante de estímulo para o meu pensamento. Como diria outro espanhol excepcional, Alfonso Sastre, Adolfo se converteu em minha sombra, com a qual teria que dialogar permanentemente a partir de então; sombra inquisidora e socrática, que me impulsionava a me formular as perguntas fundamentais, evitando qualquer tentação facilista, as enganosas certezas das aparências ou a comodidade do saber estabelecido. Por isso, não exagero ao dizer que aquela experiência de trabalho com ele mudou a minha vida e a minha visão do mundo.

Quando grande parte do que naquele momento passava pelo marxismo era uma indigesta coleção de “manuais... estalinistas” ou de confusos desvarios estruturalistas ou pós-estruturalistas – porque Gramsci ainda estava à espera de sua releitura em chave comunista e não social-democrata, e porque Mariátegui, Fidel e Che não haviam conseguido furar o obstinado europeísmo e a visão colonial que ainda prevalecia nas fileiras do marxismo –, com seu corajoso exemplo Sánchez Vázquez me ensinou a descartar tanto as imposições teóricas de uma burocracia pseudo-revolucionária como a desconfiar das modas intelectuais da época, por mais sedutoras que fossem. Essas modas, dizia, eram a isca que a burguesia oferecia com astúcia para captar e extraviar os espíritos rebeldes, mas ingênuos, desviando seu potencial contestador para os estéreis campos das pequenas disputas na insignificante “república das letras”, longe, bem longe, das cruciais frentes onde o capital travava suas cruciais batalhas contra os trabalhadores.

O marxismo de Adolfo era aberto, antidogmático, fresco e, por conseguinte, em permanente renovação, sintonizado constantemente – assim como Marx, Engels, Lênin – com o desenvolvimento das contradições do capitalismo, em cujos segredos se internava com audácia para descobrir, a partir dali, a estrada para a nova sociedade. Não o inquietavam nem a feroz crítica da direita, nem seu sistemático “desprezo”, nem a fúria das múmias da ortodoxia, em cujo encargo estava a custódia de um dogma que nada tinha a ver com o marxismo. Nesta iniciativa sua sabedoria lhe permitiu distinguir com precisão a necessidade de uma contínua reatualização da grande herança da tradição marxista do “liquidacionismo” pós-moderno, em virtude do qual os supostos “renovadores” do marxismo o “renovaram” com tanto entusiasmo que acabaram passando para as fileiras do pensamento burguês.

Por isso, com sua morte, fomos privados de um dos grandes da filosofia marxista, embora, ao reler estas linhas – esclareço – para ser fiel aos seus ensinamentos, que Adolfo foi, como bom marxista que era, filósofo, mas também sociólogo, economista, historiador e cientista político, afora poeta. Essas fronteiras disciplinares só têm sentido no interior do pensamento fragmentador e fetichizado, por isso mesmo profundamente conservador, da burguesia. Quem nos abandonou foi um intelectual de uma sabedoria e erudição deslumbrantes que enalteceu como poucos a palavra “mestre” e que jamais abdicou de suas convicções revolucionárias nem fez concessão alguma ao capitalismo, ao qual nunca se cansou de denunciar por sua incorrigível essência predadora, exploradora e anti-humana que fazia da revolução socialista uma imperiosa necessidade.

Fiel ao legado marxiano, sabia que se a humanidade não sacudisse o jugo do sistema capitalista, em todas as suas formas e manifestações, seu futuro seria a barbárie. Seus ensinamentos, recolhidos em mais de 20 livros e uma infinidade de artigos, continuarão a ser fonte duradoura de inspiração, projetando um forte feixe luz em meio às trevas produzidas pela sociedade burguesa em sua lenta, mas inexorável, putrefação. Até a vitória sempre, Adolfo!

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