sábado, 9 de julho de 2011

Notícias do Front (ou da Fronteira)

O aumento exponencial da migração de pessoas para a cidade de Altamira/PA, por conta da propaganda governamental e empresarial do possível início de instalação do canteiro de obras da usina hidrelétrica e, portanto, de contratação de pessoas, tem gerado efeito nefasto no preço dos aluguéis e dos terrenos, cujas vítimas são sobretudo as pessoas mais pobres.

Nos bairros populares da cidade, em especial nos de baixada (localizados próximos do rio Xingu ou de seus canais, e que sofrem alagações anuais por conta da cheia do rio e, com a UHE Belo Monte, serão permanentemente inundados), o preço do aluguel que, antes, girava em torno de 50 a 100 , agora subiu para 200 e até 500 reais, por conta do aumento da demanda e da tentativa dos proprietários de lucrarem.

Nesse cenário, algo de interessante está ocorrendo. As classes populares destes bairros que vivem de alugueis, sentindo na pele os efeitos perversos sobre a moradia urbana, passaram a lutar pelo direito à moradia por meio da organização de levantes populares de ocupação de áreas ao redor da cidade que não estavam (e estão) cumprindo a destinação habitacional ou de produção agrícola.
Momento de tensão: negociação entre polícia e ocupantes

Em um mês, quatro ocupações foram realizadas em áreas "abandonadas" pelos seus proprietários, e cujos ocupantes, pressionados até o pescoço pelo aumento dos aluguéis, viram como única alternativa para garantirem espaço de moradia ou, ao menos, sensibilizar o poder público para o problema social que aflora, em busca de soluções.

Visitei duas das ocupações recentemente, na qualidade de assessor jurídico. Em ambas ouvi relatos semelhantes, como a que me contou dona Elza (nome fictício), de 42 anos: "Meu marido morreu faz oito meses. Tenho duas crianças para criar e ganho um salário mínimo no emprego. Morávamos numa casa, de aluguel, e este passou de 50 reais para 200 reais. Como é que eu posso pagar isto e ainda garantir o alimento das crianças? Não dá. Saí de lá e coloquei minhas coisas na casa da minha sogra. Agora estou aqui para lutar por uma casa para ter tranquilidade."

Este movimento quase que espontâneo das pessoas em busca de moradia têm gerado muitos conflitos e disputas jurídico-policiais na atualidade. Em uma das ocupações, mais de 20 pessoas foram levadas para delegacia devido ação da polícia em cumprimento à mandado de reintegração de posse, de caráter liminar, expedido pelo Judiciário local. Em outra, telefonemas anônimos tem alertado as organizações que auxiliam as ações a respeito de possíveis atos de violência a serem cometidos contra pessoas identificadas como lideranças.

O mais importante de tudo isso é que o povo (num recorte das classes sociais localizadas nos bairros populares, em especial de baixada) não está passivo ao processo de agudização de seu direito humano à moradia. Mesmo que, outrora, não quisesse se mobilizar para lutar por pautas, como a ambiental e dos povos indígenas, mas incisivamente ligados à questão da UHE Belo Monte e, portanto, não estivesse diretamente na frente de luta contra o empreendimento, o fato de estar passando na pele por um dos problemas sociais que a mera alusão a possibilidade de implementação da obra tem gerado (aumento dos aluguéis), desencadeou processo popular de mobilização que ao mesmo tempo que procura ocupar áreas desabitadas da cidade também procura pressionar o poder público para que resolva a demanda habitacional gerada por este "estrangeiro" maior chamado UHE Belo Monte, que não pediu licença para entrar nas vidas dessas pessoas, e que agora precisa saber lidar com as demandas que não previu (ou que previu de forma minimizada), como as ligadas à moradia.

Sobre o assunto, também consultar:







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